2004/08/12

Master Class com Mikail Voscrensky


De 18 a 20 de Agosto aconteceu no Conservatório Nacional de Música uma "master-class" com o mundialmente conceituado professor do Conservatório de Moscovo Mikail Voscrensky, com recitais diários oferecidos pelos excelentes alunos desta master-class. A pianista que ganhou o 2º prémio ( o 1º não foi atribuído...) do Concurso Vianna da Motta que aconteceu este ano é aluna deste grande pedagogo do piano. Ao qual escapou a inconfidência de dizer que a incontestável vencedora do importante concurso internacional não é a sua melhor aluna...



ALGUNS PIANISTAS DE (E DO) FUTURO E A ALMA RUSSA


O recital do dia 18 foi excelente com uma interpretação brilhante da "Valsa" de Ravel por AIKO YAJIMA , uma interessante interpretação da 2ª Sonata de Rachmaninov por ATSUKO IKUTA e umas impressionantes e portentosas "Variações Diabelli" de Beethoven por YUTSUKE KIKUCHI.


Dia 19 foi a vez da talentosa CHIE ISHIMOTO que é a minha preferida entre todos os participantes desta "master class" que, assinale-se de passagem, não revelam quaisquer problemas de vulto ao nível técnico, mesmo nas peças mais dificeis do repertório pianístico. As "coisas" colocam-se ao nível estético, de leitura e ao nível da personalização, com génio, da interpretação. ISHIMOTO é dona de um talento, de uma poesia e de uma intuição musical singular que se revelaram na maneira como abordou a sonata de K331 de Mozart e nas espantosas sonoridades criadas na Suite op. 14 de Bela Bartok. Em alguns anos será mais uma pianista inspirada na cena internacional. Entretanto conto com a continuação destas master classes em Portugal para a poder continuar a ouvir.

SAORI ZETSU que vem acompanhada pela sua professora (que é aluna do mestre Voscrensky e da qual já noticiei a participação num recital com violino), tem uma técnica excelente, revela talento e musicalidade mas necessita re-pensar a sua performance, especialmente nas partes lentas das peças que esta jovem talentosa torna excessivamente monótonas e expressivamente neutras. No entanto a pianista conseguiu uma interpretação interessante do espantoso estudo opus 25 nº11 de Chopin, assim como do virtuosístico estudo nº2 em mi bemol maior de Liszt sobre um tema de Paganini.

Neste dia a decepção veio da parte do "coqueluche" desta classe a quem todos já imaginam a dar a voltas ao mundo. Pessoalmente tenho dúvidas mas a verdade é que a cena internacional está repleta de intérpretes virtuosos (ás vezes nem isso...) cujo "saber" artístico aparentemente se reduz à técnica.
YATSUKE KIKUCHI, que no dia anterior me surpreendeu pela sua impressionante interpretação da "Variações Diabelli", revelou uma total falta de intuição musical na interpretação técnicamente perfeita mas totalmente desporvida de "rasgos" da "Wanderer-Fantasie" de Schubert. Com uma obra destas esperava algo de portentoso e musical como no dia anterior. Mas não. Grande técnica mas ausência de "felling". O pouco público delirou. Evidentemente: o fogo de artifício técnico arrasta as multidões que felizmente pouco ou nada têm a dizer sobre a projecção ou não de um artista para a história. Depois desta interpretação técnica e neutra nem a boa impressão que me deixou na execução do Prelúdio e Fuga de Schostakovich (extremamente técnica mas ainda assim interessante) que precedeu a fantasia de Schubert me impediu de escrever estas linhas. No entanto não posso predizer o futuro de um pianista por performance que não me agradou. Estamos perante alguém de recursos técnicos que transcendem a vulgaridade dos finalistas de qualquer conservatório superior de música que mereça esse nome. Este pianista seguramente que não ficará no anonimato e ainda bem. Por outro lado eu tenho consciência que todos estes pianistas começaram a tocar aos 3 ou 4 anos de idade. Por isso nem o delírio técnico nem os gritos histéricos do público me abalam. Muito menos intimidam. A história da música e da interpretação musical sempre foi feita de génio e talento. Não de técnica. E assim há-de continuar a ser.


Chegou o esperado dia 20, dia em que o "mestre" se apresentou. A minha expectativa era grande. Como o mestre disse, nem valia apena entrevistá-lo pois eu segui as classes que ele deu a estes alunos de excepção. Sem dúvida. Fui o único priveligiado deste país. Acho que o mestre gostou das "dicas" que eu dei face à execução dos pianistas que com ele trabalharam durante estes dias: nada de pedais em Bach (o mestre achou excêntrica esta ideia mas continuo a defendê-la como fundamento técnico primeiro: o pedal em Bach só deve ser utilizado numa prespectiva estético-estilística e jamais para fazer ligações entre notas para as quais se devem encontrar as dedilhações adequadas), poesia sem romântismo em Mozart, dinâmicas sob estrito controle em Beethoven, fluência e intensidade discursiva adequada à construção do "arco frásico" nos lentos, clareza em Debussy com amplo mas criterioso pedal. Evidentemente que o mestre faz uma coisa que eu não faço: "salta" para o piano e mostra como é. Seja em que peça fôr. Não há limite técnico para o mestre. Disse-me que foi um prazer trabalhar comigo: um elogio sem grande sentido. Eu aprendi. Aprendi muito. E espero que para o ano possamos ter a conversa "tipo entrevista" que não tivémos este ano.
Que esperam que vos diga das interpretações do mestre? Não estava escrito imprescindivel quando anunciei este recital? Era gratuíto!!! Como devem calcular não vou fazer uma crítica ao mestre.

Passando ás interpretações dos pianistas alunos do mestre nesta master classe (o mestre foi o último a tocar, evidentemente), vou referi-los por ordem de apresentação:

CHAN HO PARK, ofereceu-nos uam intensa Fantasia em fá menor op. 44 de Chopin. Grande técnica, grande sustentação no tema B ao qual deu um carácter quase meditativo, paleta dinâmica invejável. Algo técnico mas muito bom.

EUN-YOUNG SEO, uma das mais jovens do grupo. Grande técnica mas certa frialdade. Uma certa monotonia nos lentos mas uma pianista com potencial.

ROMI KATO, a mais jovem do grupo. Interessante na construção de sonoridades no Étude-Tableau em mi bemol maior op.33 nº6 (estava escrito o 5º... os programas continham sempre erros, excepto no dia em que eu dei uma ajuda!) de Rachmaninov.

A CHISAKI KARAKI (no programa estava Chikasi...) é uma amiga. Já lhe disse o que tinha a dizer. Poderei dizer que foi a única, neste dia, que arrancou "bravos" do público, coisa que para mim vale o que vale.

Todos estes pianistas são o sonho de qualquer professor. O futuro dirá quais os que vão fazer história. Não tenho ainda "dados" suficientes para fazer previsões. Talvez para o ano se esta fantástica master-class continuar em Portugal. AST



Iº FESTIVAL DE VIOLINO INTERNACIONAL DE LISBOA

ZAKHAR BRON, Director Artístico


Concurso Internacional de Violino

Classificação Final:

1º CHI UNG CHOI, Coreia.

2º CATHERINA LENDLE, Alemanha; JI WON KIM, Coreia; NADEZHDA ARTAMONOVA, Rússia.

3º ANDREY PROVOTOROV, Rússia; ERICA RAMALLO LUCINI, Espanha.


Concorrentes Eliminados convidados a realizar um recital na Sala dos Espelhos:


JI WON SONG, Coreia.


ALEXANDER PAVTCHINSKII, Portugal/Ucrânia.


Desejo saudar os excelentes músicos, quase todos da comunidade russa que integram as várias orquestras portuguesas com alguns portugueses à mistura que, com honorários simbólicos, se reuniram permitindo a constituição de uma orquestra de nivel superior, orquestra esta que acompanhou os concorrentes finalistas na prova com orquestra.

Quero também expressar o maior respeito pelo Maestro Vladimir SIMKIN (Director Residente da Orquestra Sinfónica de Moscovo) que gratuítamente (o maestro pagou mesmo do seu bolso o alojamento no hotel!) dirigiu esta orquestra. Inclusivé deu-se ao trabalho de trazer consigo as partituras que não estavam disponíveis por cá...

Finalmente è necessário dizer que se não fosse a decisão de Lilia Rakova de criar este festival, convidando os seus "amigos famosos" para o júri e para realizarem as master classes, este evento nunca teria acontecido.

Há evidentemente que assinalar as péssimas condições acústicas em que decorreram os recitais, com janelas abertas, portas a bater, ventoínhas a fazerem ruído e leques a abanar. O Palácio Foz pode ter condições para albergar concertos e recitais desta natureza. Se conseguir proporcionar o mínimo indispensável para a concentração dos intérpretes. E do público... AST


[Nota a posteriori: o Festival de Violino Internacional de Lisboa não se voltou a concretizar uma vez que os "sponsors" portugueses não honraram os seus compromissos]