2008/03/19

Liberalismo? Que é isso?

Quando era pequeno era marxista. Leninista e por aí fora... Quando estive na Albânia o susto foi muito menor que aquilo que esperava. Por este canto ocidental da Europa diz-se cobras e lagartos dos albaneses. Nem câmara fotográfica levei com mêdo de ser assaltado... Lembro-me da minha indignação, na primeira vez que estive na Holanda, por terem achado não ser eu bem português devido aos cabelos castanho-claros e à pele demasiado branca, segundo eles, para alguém vindo do extremo sul da Europa. Se não sou bem português não é seguramente devido à côr da pele. Ou dos cabelos... Apesar disso fiquei adepto do "liberalismo". Na altura não distinguia entre liberalismo-liberalismo e liberalismo à holandesa, que no fundo era (ainda é...) "estado-social". Explicaram-me, por exemplo, sobre aquele grande teatro que tinham acabado de construir, que não só não tinham havido derrapagens orçamentais como isso se devia à ausência de corrupção. Também me falaram do interesse dos holandeses pela cultura, ficando eu definitivamente conquistado para o "liberalismo". Nessa altura ainda não conhecia a Koninklijk Concertgebouworkest (Royal Concertgebouw Orchestra) que é uma das 3 melhores do mundo, assim de vistas restritas porque, felizmente, existem mais que 3 orquestras "melhores do mundo"... Um dia Slavoj Žižek (por um mero acaso conheci-o pessoalmente) disse-me que o fim do comunismo não melhorou a situação das pessoas na ex-Jugoslávia. Agora, quando olhamos para a Rússia actual, Rússia sobre a qual parece pender uma qualquer fatalidade (como diz uma personagem em Andrei Rubliov, obra de Andrei Tarkovsky que é talvez o filme mais genial de todos os tempos), ficamos com poucas dúvidas disso. Na realidade a ex-Jugoslávia "comunista" (para muitos "revisionista", ou pior...) era bem mais "liberal" que a Rússia economicamente "liberal" de Putin. Não sou comunista. Isso foi quando era pequeno (adolescente, porque quando era pequeno fui "anarco-comunalista"...). No início do ensino preparatório fiquei logo a simpatizar com o socialismo porque um professor me disse que socialismo era dividirmos a nossa comida com aqueles que têm fome. Graças aos professores que fui tendo, alguns acusados de "comunistas" sem o serem (e mesmo que fossem!), fui compreendendo que as coisas eram, infelizmente, bem mais complicadas. Por curiosidade, também decidi estudar música mais a sério devido ao incentivo do professor de educação musical que tive no ensino preparatório... Actualmente considero que o "liberalismo" é uma ficção. Se tal coisa existisse os Estados deixariam falir os grandes bancos que cometem erros fatais, em vez de os salvarem directa ou por interposta pessoa. Dizerem que a falência dessas instituições privadas conduziria à descredibilização do "sistema", vale rigorosamente o mesmo que todos os "senãos" colocados ao funcionamento dos "sistemas comunistas" e todas as objecções à sustentabilidade a prazo do "estado social". Na verdade a insustentabilidade do "sistema liberal" não é uma possibilidade a prazo. Já aconteceu quando o Estado interveio na banca privada, mal gerida, para salvar o "sistema". Basicamente, no que à Europa diz respeito, a análise de Max Weber sobre o sul católico (a África e Médio Oriente islâmicos...), pobre e fechado e o norte protestante, aberto e próspero, mantém a pertinência. É só olhar, sem sequer ser necessário ver bem. Nuances há-as seguramente, nomeadamente despoletadas pelas grandes migrações populacionais, mas essencialmente o norte e o centro europeus vão manter a tradição do "estado social". O Sul não se percebe que sendeiros trilhará mas será quem sofrerá mais com as alterações climáticas. Isso já se percebe bem. AST

Nota: um dos livros interessantes e recentes que aborda esta questão, traduzido para português, é "Tornar Eficaz a Globalização", do prémio Nobel da economia (2001) Joseph Stiglitz. A revista TIME (Europa), March 31, 2008, pag 22 e seguintes, traz uma peça muito interessante e elucidativa sobre a temática deste post. Esta edição da revista é dedicada ao Dalai Lama. Um valor acrescentado para este número da revista.