A ética republicana é como o Espírito Santo: não se consegue explicar exactamente o que é, nunca se avista mas acredita-se que opera milagres. Lembrei-me muito da ética republicana ao ver as imagens da demissão de Michael Martin, o speaker da Câmara dos Comuns. Tal como nos anos 70 era difícil explicar, em Portugal, as razões da demissão de Nixon, pois usar as polícias para espiar as campanhas dos partidos da oposição era então um direito adquirido do governo, também hoje surge como bizarro que este homem se tenha demitido não porque ele mas sim alguns deputados tenham utilizado dinheiros públicos, ainda por cima em quantias irrisórias, em benefício próprio ou mais propriamente em benefício dos seus jardins e casas. Isto é o que acontece nos países onde a ética é simplesmente ética e não uma basófia do regime.
Nota: claro que os portugueses não percebem isto, apesar de que neste caso não foi exactamente assim... Como não percebem a maioria dos preceitos elementares, como, por exemplo, aquele que diz que nos transportes públicos, ou nas vias públicas, só se deve ouvir música, ou o que quer que seja, com auscultadores e com a intensidade regulada de forma a que o parceiro do lado não ouça o nosso som. Vou enviar uma "reclamação" para o comissário europeu dos transportes, com a cópia de uma carta na qual um responsável de um departamento estatal encarregado de tratar reclamações, ou determinado tipo de reclamações, declara que "prevaleceu o interesse comum", ou seja, devido a um misterioso "interesse comum" (interesse do "chauffeur"? interesse da maioria dos passageiros? interesse do "chauffeur" e de alguns passageiros?) tive que sofrer o som que foi difundido pelos altifalantes de um autocarro de transporte público. A carta que aquele responsável me enviou elucidará os comissários europeus (pensei melhor e vou enviar a todos) do grau de bestialidade e aberração que domina este país pequenininho, estupidificado e irritante.
Nota 2: Michael Martin foi obrigado a demitir-se pois perdeu o apoio do seu partido (trabalhista), e teve um fim de carreira humilhante. Gordon Brown tentou desculpabilizar-se atirando sub-repticiamente as culpas para cima de Martin, mas este mereceu o fim de carreira que teve, porque de operário e sindicalista transformou-se no principal defensor do status quo. Houve deputados que pagaram praticamente as casas e apartamentos que adquiriram com o dinheiro dos contribuintes, gastando portanto um "pouco" mais que "quantias irrisórias"... Houve dois membros da Câmara dos Lordes que foram destituídos por terem aceite dinheiro de um jornalista disfarçado de homem de negócios, para alterarem determinadas leis, coisa que seria muito grave mesmo em Portugal... Houve pelo menos dois membros da Câmara dos Comuns que mentiram sobre o destino do dinheiro que utilizaram (um deles continou a receber a quantia destinada ao pagamento do empréstimo bancário para o apartamento ou casa mesmo depois daquele estar liquidado), correndo o risco de eventualmente virem a ser presos. Mas em que raio de reino ou Estado se viu os contribuintes pagarem os empréstimos bancários contraídos pelos deputados? Em Inglaterra é exactamente isto que tem acontecido, em total legalidade! Parece que também há outro escândalo com as despesas em viagens dos britânicos deputados (e respectivas famílias, claro, pois eles gostam todos muito, muito, de viajar)...
Nota 3: o Berlusconi é um imbecil, bem pior que isso, e o país que representa, e domina, envergonha a UE. No entanto, o crime que ele cometeu ao andar com uma jovenzinha de 17 anos é incomparavelmente menos grave que os crimes monstruosos cometidos em Portugal no mundialmente conhecido caso Casa Pia.
Nota 4: tenho vergonha de pertencer a um país onde o primeiro-ministro vai ao país do lado discursar num espanhol manhoso, enquanto os habitantes da Catalunha, os galegos e os vascos lutam por dignificar os seus idiomas.
Nota 5: estou estupefacto com a Amnistia Internacional: primeiro condena as torturas praticadas pela polícia numa infanticida, que apesar das torturas que sofreu continua bem viva. Depois então é que trata os assassinatos de mulheres, por "companheiros" (mas que companheiros...) e "ex-companheiros", em Portugal, que cresceram para a impressionante e escandalosa média de mais de quatro (4!) assassinatos por mês. E até parece encontrar a explicação (desculpabilizante?) deste aumento na crise económica... Todos nos lembramos que, muito antes do 11 de Setembro, se tivesse acontecido uma invasão do Afeganistão, explícita ou implicitamente, o mundo, ou uma parte substancial do mundo, a apoiaria, nomeadamente para libertar as mulheres do jugo dos "estudantes de teologia", vulgo Talibans. Evidentemente que as portuguesas não são como as afegâs. São de certeza mais estúpidas e arrogantes e têm meios de defesa à disposição que se não utilizam é porque não querem. Mas, fundamentalmente, a lei portuguesa é branda, demasiado branda, com os agressores. Como é possível, por exemplo, que o ex-presidente do Benfica seja condenado a 11 anos de cadeia, por crimes económicos, e o esfaqueador de uma mulher, que por acaso sobreviveu, só tenha sido condenado a 6?
Regresso de imigrantes está a deixar o país mais pobre
Portugal está a perder capacidade de atracção para os imigrantes. E, se o país não for capaz de segurar os imigrantes que tem e atrair novos, vai ficar mais velho e mais pobre, alertam vários especialistas ouvidos pelo PÚBLICO, segundo os quais é urgente colocar um travão à tentação xenófoba que ameaça em tempos de crise.
Por estes dias, os imigrantes representam seis por cento do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2007, foram responsáveis por 9,7 por cento dos nascimentos. E uma projecção recente do Instituto Nacional de Estatística (INE) mostra que, sem imigrantes, a população descerá em 2060 aos 8,2 milhões. Muito antes disso, já a sustentabilidade da Segurança Social terá caído por terra.
Apesar de ainda não ter reflexo nas estatísticas oficiais, a saída de estrangeiros - sobretudo ucranianos -, a par da desaceleração das novas entradas, é uma certeza apontada pelos estudiosos do fenómeno migratório. "Só daqui a um ou dois anos é que esta diminuição terá efeitos estatísticos, porque o imigrante, quando se vai embora, não vai ao centro avisar, aliás, muitas vezes o que acontece é que eles retiram-se mas mantêm activo o visto para Portugal deixando aberta a possibilidade de voltar", explica Pedro Góis, investigador do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra.
Ilegais entre "55 a 75 mil"
No caso dos ucranianos, eram 41.530 em 2006. Em 2007, baixaram para os 39.480. Os números de 2008 deverão demonstrar nova diminuição. Mas longe ainda da "fuga" registada na realidade. "A maior parte escolhe a República Checa ou a Polónia - países de Leste mas mais próximos da União Europeia que começam a crescer em termos económicos", diz Góis. Há também os que vão trabalhar em Espanha "e vêm a Portugal só para renovar documentos", como afirma Manuel Solla, da Comissão Nacional para a Legalização de Imigrantes. Segundo Solla, a saída de ucranianos ocorre sobretudo entre os ilegais. "Já são menos de metade".
O mesmo com os brasileiros. Com um total de 66.354 legais, estes perfaziam, em 2007, a maior comunidade de estrangeiros. Agora, e apesar de o salário mínimo português continuar a triplicar o brasileiro, "há indícios de retracção neste fluxo, seja pela desaceleração de entradas seja pelo regresso de muitos ao Brasil", aponta Góis.
Todos concordam que um cenário de retracção dos imigrantes será fatal. "O país só ganha em suster os imigrantes que tem", avisa Eduardo Sousa Ferreira, professor catedrático do Instituto Superior de Economia e Gestão e autor de um estudo sobre a contribuição dos imigrantes para a economia portuguesa. "A imigração contribui para seis por cento do PIB, o que é uma percentagem enorme", acrescenta, convicto de que "a alternativa à entrada de imigrantes é uma muito maior estagnação da economia".
Os 420.189 imigrantes que, no final de 2007, se encontravam em território nacional, segundo o SEF, perfazem cinco por cento da população do país e oito por cento da população activa. Aqui não entram em linha de conta os ilegais. Serão entre "55 mil a 75 mil", nas contas de Solla, para quem, mais do que preocupar-se com quotas, o Governo devia "dar autorizações de residência a quem, tendo entrado de forma irregular, tenha contrato de trabalho válido e contribua para a Segurança Social".
Tal nem sempre acontece, segundo Eduardo Sousa Ferreira, "porque há um custo administrativo associado e, por outro lado, os empresários também não estão interessados nisso, porque um ilegal tem um grau de obediência que não teria se estivesse legal". Dito de outro modo, "os empresários portugueses aproveitam para ganhar mais à custa dos imigrantes e o Governo não está interessado em contradizê-los". in publico.pt, 25.05.2009 - 08h07
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