Álvaro Teixeira: Creio que tem uma fixação por Mahler...
Uri Caine: Eu gosto de tocar a sua música. Gosto mesmo muito. Antes tocava com um grupo grande. Hoje toco a solo e é outro sentimento.
AST: No princípio do recital de hoje por duas vezes voltou a temas mahlerianos. A sua admiração por Mahler é grande?
Uri Caine: Claro. Estudei a sua música durante muito tempo. Gosto muito da música da Europa Central. Muitas pessoas consideram a música de Mahler como a base máxima de inspiração que um músico de jazz pode encontrar mas existem muitas maneiras de a interpretar. O próprio Mahler interpretou as suas obras de maneiras diferentes.
AST: Antes de tudo é um músico de jazz ou um músico de fusão?
Uri Caine: Sou um músico de jazz. Eu improviso inspirado em Mahler, no drum in bass, nas músicas populares... Em muitas coisas e em muitas maneiras de estruturar a improvisação.
AST: Enquanto improvisa tem uma preocupação estrutural?
Uri Caine: As músicas têm estruturas. Muitas músicas têm uma estrutura aberta. Os standards de jazz têm diferentes fórmulas de improvisação. Temos estruturas mas estruturas diferentes.
AST: Quando há pouco estava a improvisar sobre o tema de Diabelli introduziu repentinamente um tema da nona de Beethoven. Pareceu-me um pouco forçado...
Uri Caine: Eu fiz o arranjo das Diabelli para orquestra...
AST: Eu sei...
Uri Caine: Diabelli foi um editor italiano que desafiou alguns compositores a trabalharem sobre um tema seu. Beethoven criou algo de forma bastante sarcástrica bem patente nalgumas das variações. Tal acontece também nas minhas variações.
AST: Mas no trabalho com o Concerto Köln fez o mesmo. Creio que foi na quinta variação, já não me lembro, que introduziu o tema da quinta (sinfonia). E aí fê-lo de maneira mais conseguida e desenvolveu de forma mais interessante. Está de acordo comigo?
Uri Caine: Talvez. Não sei. Sabe que é um risco. Por vezes não corre tão bem.
AST: Que pensa da música contemporânea... "erudita"?
Uri Caine: Há muitos estilos de música contemporânea. Desde Boulez até Stockausen...
AST: Esse vem cá para a semana...
Uri Caine: Ok!
(risos)
Uri Caine: Mas também há a música electrónica. Diferentes formas de dance music. Há os desenvolvimentos de um Frank Zappa ou de um Jimmy Hendrix... De uma maneira geral interesso-me muito pela música contemporânea.
AST: Por vezes parece existir um fosso entre o público e os compositores contemporâneos... Que lhe parece?
Uri Caine: É verdade, por vezes. Mas não é um grande problema. Sempre houve uma "gaffe" entre os criadores e o público. Para mim não é um problema fazer concertos muitas vezes inteiramente dentro de uma estética contemporânea. Não é um problema ter muito ou pouco público nesses concertos. Os músicos devem poder desenvolver a sua criatividade no sentido que lhes parece correcto.
AST: Mas no seu caso existe uma excelente relação com o público...
Uri Caine: Ás vezes... Tento fazer o melhor. Mas se não funcionar... Eu penso que a melhor forma de fazer música é desejar fazer o melhor.
AST: Será que o facto de vir do jazz lhe traz um público mais alargado que o público "normal" da música contemporânea?
Uri Caine: Não estou certo disso. Há um público que só gosta de jazz e que não considera que o que eu faço seja jazz. Também se pode passar o mesmo com o público da música contemporânea...
AST: Ok. Muito obrigado.