2004/10/19

UM RECITAL EXCELENTE A MEIA SALA


O Quarteto Vermeer apresentou-se na Gulbenkian poucos dias após a sala abarrotar com uma cantora mediática produzida por uma grande editora e amplificada pelos media que mais não fazem que reproduzir desmesuradamente a imagem que a etiqueta e os agentes vendem.


Como um quarteto de cordas não tem e dispensa todo este aquele aparato de produção de semblante, o público que ocorre procura música e felizmente encontra-a.


O recital dos Vermeer foi um recital de elevado nível e conteúdo musical que o público quase histérico que aplaudiu a famosa soprano não teve, exceptuando as aberturas de óperas executadas pela orquestra que funcionaram como momentos de repouso para a diva. Evidentemente que os quartetos de cordas foram escritos para pequenas salas e consequentemente para pequenos públicos. Inteligente premonição dos compositores...


No que respeita à actuação dos Vermeer é possivel falar-se de música e de estilo e dizer-se que poderia ser mais assim ou assado. Poderia dizer-se por exemplo que os pianíssimos que constam na partitura do Mendelssohn não foram executados e que a paleta dinâmica foi bastante contida. Poderia avançar-se com a ideia de uma interpretação racionalista do romântico Mendelssohn. Pessoalmente gostei do conceito que os Vermeer defenderam. O mesmo não pensou a violinista de uma orquestra em conversa de final de concerto que frisou exatamente aquela ausência dos pianíssimos que constam na partitura acrescentando que são de muito difícil execução. Tal como a violinista, achei o Quarteto de cordas de Carl Czerny (exatamente: aquele dos exercícios para piano) uma obra muito interessante, muito bem escrita e a interpretação que os Vermeer nos ofereceram paradigmática.

Do Quarteto nº8 D112 de Schubert com que o recital começou não posso dizer que me sentisse especialmente "galvanizado" mas o nível global da execução foi bom.

Quanto ao encore que foi o andamento final do quarteto "Sunrise" de Haydn, tenho de dizer claramente que prefiro as interpretações dos Festetics, dos Lindsay ou dos Mosaiques. Mas devo acrescentar que se tratam de agrupamentos que se dedicam fundamentalmente ao classicismo e tocam em instrumentos da época, excepto os Lindsay que tocam (genialmente) todo o repertório para quarteto de cordas.


Básicamente tivemos um recital de grande nível com a casa por metade. O que não deixa de ter as suas vantagens. Multidões à procura do suposto sublime provocam-me náuseas. Sobretudo quando falam e comentam (ostensivamente) fazendo-se passar por "especialistas" do género... AST