2004/11/22

MIDORI E ROBERT McDONALD EM LISBOA


Foi no dia 20 e (talvez por ser fim de semana?) o grande auditório da Gulbenkian não estava cheio o que é de espantar porque o público português gosta de vedetas e Midori é uma das violinistas mais famosas e populares da actualidade. Ou será que só gostam de cantoras?!

Musicalmente o recital de Midori foi de uma riqueza muito maior que o que qualquer soprano que deslize para as árias de ópera, tão do agrado do "grande público", nos poderá alguma vez oferecer...


Indo directo ao "osso": Midori é uma intérprete sensivel mas possui um som agreste nos agudos. Midori é uma intérprete inteligente mas por vezes "esmaga" as escalas como aconteceu com a fabulosa sonata para violino e piano de Debussy. Midori é uma intérprete que não se fecha num repertório pré-estabelecido mas a peça que encomendou a Michael Hersch é "longa e chata como a espada de D. Afonso Henriques" (claro que a culpa da falta de "rasgos" do compositor não é da violinista). Midori é uma intérprete arrebatada mas a sua interpretação da sonata para violino e piano op. 108 nº3 quando comparada com outras interpretações sejam as de um "grande" como Itzhak Perlman, seja com as de outra "vedeta" como Vengerov, empalidece por falta de balanceamento e ausência de um som "quente" que faça justiça ao romantismo "brahmsiano".

E o resto?

O resto foi o melhor pois a sonata de Leo Janácek que é uma grande obra de um grande compositor foi interpretada de forma musical e convincente. Só por isso valeu a ida à Gulbenkian.


Que balanço fazer de uma violinista que vive da imagem criada por uma editora? Midori talvez não seja uma violinista que vá marcar uma geração. No entanto possui uma excelente técnica que lhe pode facilitar a construção de uma sonoridade que a individualize. A sonoridade que Midori actualmente consegue não é "um grande som". Nos instrumentos de corda é o som que caracteriza um intérprete. Evidentemente que o fraseado e a capacidade analítica materializada de maneira inteligente e musical nas leituras que faz são fundamentais e aqui Midori marca pontos, apesar de não ser a intérprete "clara" que eu gostaria de escutar. Pontos estes que são acrescidos de outros pela fabulosa escolha do repertório que oferece aos seus públicos. Mas é o "som" que singulariza e que pode tornar único um intérprete de cordas. Um som que vai directamente do coração para os dedos... E é isso que em meu entender Midori ainda não alcançou.
Quanto a McDonald é um excelente pianista acompanhador que muito contribuiu para a grande qualidade deste recital. AST