2005/09/28

GUSTAV LEONHARDT NO FESTIVAL DE ORGÃO DE LISBOA

A carreira de Leonhardt corresponde ao nascimento da "nova" interpretação da "música antiga", ao seu desenvolvimento e à sua contemporaneidade. Foi Leonhardt quem no cravo e na direcção de pequenos grupos usando instrumentos da época, esteve na origem de todo um revivalismo que atinge, na actualidade, uma espécie de apogeu, com alguns dos seus ex-alunos a imporem-se na cena internacional com algum vedetismo, por um lado. Por outro lado, o quase infindável filão de cravistas excelentes que, provindos de uma linhagem quase directa, garantirão a continuidade da obra de Leonhardt que ficará para sempre como o "grande pai" e simultâneamente como o "paradigma".

Seria árduo fazer-se uma listagem exaustiva da obra de Gustav Leonhardt. Decidi por isso isolar três momentos, muito próximos, da sua obra que dificilmente poderemos não qualificar de "grandiosa": a gravação da partita do Clavierubung II no dia 3 de Novembro de 1967; o registo das suites francesas em 1975 e finalmente o das variações Goldberg em 1978. Obras, todas elas, do mestre de Leipzig.

Isolei estes três momentos, em meu entender particularmente conseguidos (não obstante a genialidade de todas as gravações mais recentes do intérprete), porque nos permitem fazer uma ponte directa, de quase 40 anos, com o recital que ontem (27 de Setembro de 2005) Gustav Leonhardt nos ofereceu em Lisboa.
Estou-nos a remeter, nomeadamente, para a obra com que finalizou o recital: Aria Variata alla Maniera Italiana BWV 989 de Johann Sebastian Bach.

Ontem, como nas gravações de há quarenta anos, Leonhardt situou-se numa espécie de transcendentalidade que pela inspiração profunda e tranquila, sem necessidade de recorrer a pirotecnias rítmicas, nos dá uma dimensão outra, que é dele Gustav Leonhardt, que o coloca sempre pelo menos um grau acima do mais genial dos génios do cravo, sejam eles quais forem, pois, felizmente, graças a ele - Leonhardt - há muitos na actualidade.

A interpretação que fez das variações "alla maniera italiana" à volta de uma ária simples, emanadas do punho do grande Johann Sebastian, remetem-nos directamente para o passado, nomeadamente para aqueles três momentos que escolhi, em que Leonhardt optou pela metafísica. Simplesmente a sua metafísica é uma metafísica do belo. Uma metafísica do genial. Ao acesso de todos. Basta estar disponivel, livre, e ouvir. E pela audição somos conduzidos, pelos dedos inspirados de Leonhardt, através do melhor que a "humana condição" nos conseguiu oferecer. E que já foi bastante. AST









FESTIVAL DE ORGÃO DE LISBOA
Junto um elogio a este festival que já vai na nona edição e é querido dos lisboetas, e deixo só a sugestão de no programa constar SEMPRE a tonalidade das peças, para nos ficarem elucidados os caprichos de diapasão dos instrumentos.
A bicha de pessoas que se estendia até depois da Trindade também pode elucidar a opinião corrente e liberal que reza que o povo não dá valor a concertos grátis. http://arauxo.blogspot.com (29.9.05)