Anne Fontaine, neste trabalho, surpreendeu-nos. Não estamos a falar de aspectos técnicos pois os seus grandes planos são impactantes, as suas sequências, nomeadamente a sequência final, impressionantemente poéticas (ainda que a realizadora se situe numa "linhagem" hiper-realista) e as suas cenas são dotadas de uma força fora do comum, graças também ao compositor Pascal Dusapin que aceitou encarregar-se da "banda sonora". Não terá sido por acaso...
A gestão do tempo e a forma como trabalha o "desvelar da verdade" revela uma inteligência rara, deixando-nos desorientados pelo menos duas vezes: a forma como constatamos quem é o assassino depois da criação de um contexto que tornara praticamente inverosímel essa possibilidade (*) e o grande plano da protagonista e do amante, antes da sequência final, que nos lança numa incrível dúvida resolvida no plano seguinte que confirma o suicídio do "serial-killer", sem o qual estariamos na insuportável trivialidade do lugar-comum e na infindável lista de filmes com killer's que acabam por perecer ás mãos da justiça que encarna "o bem".
Se referimos o aspecto "fora-de-série" deste trabalho, estamos a pensar, seguramente, na "composição", no "conceito" que garante não só consistência da obra enquanto obra de arte mas lhe atribui uma "grandeza" que a coloca degraus acima do trabalho do realizador talentoso e dotado de "boa escola" que já de si está acima da "média". E essa "capacitação" que transcende a "grande técnica" e a "leitura inteligente", tem a ver com o íntimo da criadora, com a sua "personagem própria" e com a sua sensibilidade sob efeito da qual traduz o mundo.
Não pretendemos divagar aqui por entre os aspectos - afinal todo o filme - passíveis de uma abordagem psicanalítica com complexidade garantida.
Desejamos simplesmente alertar para o facto de que este filme de Anne Fontaine, tendo como protagonista central uma transcendente Isabelle Carré, filme apresentado em ante-estreia portuguesa na Festa do Cinema Francês, deve ser colocado, sem hesitações, entre as grandes obras cinematográficas do século XXI. Pelo menos. AST
(*) Esta é uma matéria interessante... Inverosímel porquê? Não nos tinha sido mostrada "a verdade" quando os protagonistas se cruzaram com a mãe do "psicópata"? Uma mãe de voz monocórdica, indiferente, "neutra"... Porquê então a surpresa? Projectamo-nos tanto na protagonista que recusámos aceitar que ela amasse um assassino? Ou tivémos mêdo que não fosse capaz de transcender a vulgaridade destruindo-se assim, cruel e friamente, a imagem que dela construímos?
As(os) premiadas(os) do World Press Photo (www.worldpressphoto.nl) mostram-nos o mundo como ele é. A ver. Na verdade indispensável.
O relatório (do Conselho de Cooperação Económica) refere em concreto o TGV e a OTA. No primeiro caso, avançando com a execução "sem demoras"... Já a construção do novo aeroporto é descartada... sugerindo-se a expansão da Portela e a aposta em aerogares alternativas, designadamente para as low cost. Público, 4 Outobro de 2005, pag. 37