2009/10/17

Estado falhou na fiscalização das contrapartidas

A fiscalização do Estado na montagem e gestão dos projectos de contrapartidas devidas pela compra dos submarinos alemães falhou nos momentos determinantes do processo. É o que se retira do teor da acusação do Ministério Público (MP) e do respectivo relatório pericial, contra os sete gestores portugueses e os três alemães acusados de burla qualificada e falsificação de documentos.

O contrato de compra dos dois submarinos, assim como muitos outros de material militar que envolvem quantias avultadas (este vai custar ao Estado perto de mil milhões de euros), implica a contratação de um programa de contrapartidas, que integram negócios e projectos que pretendem ajudar a modernizar e fortalecer o tecido empresarial nacional.

A falha também de regulação explica, por exemplo, que o maior programa de contrapartidas de sempre, envolvendo um consórcio de grandes empresas alemãs, VW incluída, tenha deixado cair o único projecto que o ligou à Autoeuropa. O objectivo era comprometer a maior fábrica do país a aumentar o seu valor acrescentado nacional com a entrada então prevista de um novo veículo, à data o Scirocco, mas nunca avançou.

Insuficiências várias

Nas centenas de páginas da acusação baseadas eme-mails, actas e documentos, é perceptível a incapacidade das entidades fiscalizadoras, nomeadamente as tutelas ministeriais e a Comissão Permanente de Contrapartidas (CPC), de decidir previamente os projectos a apoiar e de verificar a documentação, para além de alusões sucessivas à insuficiência de recursos humanos da CPC.

O MP detectou, por exemplo, situações de dupla facturação na contabilização das contrapartidas e outras em que o valor comunicado era superior ao facturado. O facto não foi detectado pela CPC não só por falta de pessoal, diz o MP, mas também por uma relação de "confiança" que justificava a dispensa da apresentação de facturas, bastando-lhe a listagem das mesmas.

Um dos passos de fragilização da capacidade do Estado ocorreu em Março de 2002, com Brandão Rodrigues à frente da CPC. A entidade deixava, entre outros pontos, de fazer visitas obrigatórias a empresas e passava a aceitar que os pedidos de pagamento fossem acompanhados apenas por uma demonstração do "cumprimento atempado das obrigações de prestação de contrapartidas".

A três meses da assinatura do contrato de contrapartidas, que se realizou em Abril de 2004, era a Ferrostaal, empresa que integrava o consórcio alemão, que sugeria às autoridades portuguesas o método de confirmação das contrapartidas. A arguida Antje Malinowski indica, em Janeiro de 2004, que a CPC teria aceite a sua sugestão de apresentar confirmações escritas assinadas pelos beneficiários, relativamente aos montantes de créditos a submeter, como a Ferrostaal tinha feito na África do Sul (cujo programa de contrapartidas acabaria por ser objecto de investigação judicial) e em Itália. Mais tarde anuncia que a CPC "tinha aceitado uma forma simplificada de comprovação das contrapartidas, dispensando a revisão das facturas por um ROC, encarregando o GSC [consórcio alemão] de autenticar as mesmas", reservando a CPC o direito de, "periodicamente, visar as cópias em poder do GSC", tal como consta na acusação.

O relatório pericial que acompanha o despacho de acusação chama a atenção de que o maior contrato de contrapartidas assinado em Portugal expôs o Estado "a acções em seu prejuízo" e "sem a protecção adequada", citando dois pontos concretos: aprovação tácita de contrapartidas, no prazo de 90 dias, e limite da responsabilidade por parte do GSC a dez por cento do valor total dos projectos. O prazo de 90 dias foi manifestamente curto para a capacidade de resposta da CPC, em vários momentos. A medida permitia libertar automaticamente os créditos para as garantias bancárias referentes aos projectos em causa.

Projecto Autoeuropa

As primeiras referências ao projecto da Autoeuropa surgem na troca de correspondência entre os representantes da Ferrostaaal e da Acecia, em Janeiro de 2004, num momento em que uma boa parte das pré-contrapartidas exibia fracas taxas de execução. O projecto, no valor de 20 milhões de euros, tinha partido de um estudo da Inteli, para aumentar o valor acrescentado nacional nos veículos produzidos na Autoeuropa, aproveitando então o lançamento do Scirocco. O projecto envolvia engenharia de desenvolvimento, o que o tornava mais complexo. O presidente da Acecia alegaria mais tarde que a Autoeuropa não tinha "peso nem capacidade de decisão" e que o projecto não era exequível. Acabou por anunciar aos seus associados que o iria substituir "no silêncio dos bastidores" por outros projectos. Viria então a cair.


DCIAP “não é um departamento para recuperar dinheiro”

O procurador-geral da República, Pinto Monteiro, disse hoje, em Leiria, a propósito da Operação Furacão, que o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) “não é um departamento para recuperar dinheiro”. “Nunca este departamento pode ser uma operação fiscal”, afirmou, considerando, contudo, que no âmbito deste megaprocesso o DCIAP “tem de fazer as duas finalidades”.

“Na Operação Furacão há ilícitos a que a lei permite a suspensão provisória: portanto, pagaram, estão fora. Há outros ilícitos que não, que têm de ser acusados. É isso que o DCIAP tem de fazer”, declarou Pinto Monteiro à margem da cerimónia de apresentação do livro “A Prova do Crime”, da autoria de Fernando Gonçalves e Manuel João Alves.

O procurador-geral da República sublinhou que o “Código Penal permite hoje uma série de medidas que tentam reduzir tudo a uma mera condenação”, exemplificando com a suspensão provisória do processo.

“Foi requerida a suspensão provisória nalguns casos, que vão ser concedidas. Noutros casos, há os ilícitos criminais”, acrescentou Pinto Monteiro ainda sobre o processo, através do qual já foram recuperados “milhões de euros” , adiantou, sem precisar valores.

Nota: o DCIAP não é um departamento para recuperar dinheiro mas alguém tem de o recuperar e as leis devem ser modificadas para favorecer essa recuperação.


O drama das canetas de feltro

Os casos de cegueira verificados no Hospital de Santa Maria em seis doentes submetidos a tratamentos com Avastin foram provocados pelo uso de um medicamento errado, apurou a investigação do Ministério Público hoje revelada pelo “Correio da Manhã”.

Segundo o jornal tratou-se de um erro levado a cabo na rotulagem e confirmação do medicamento em causa à chegada à farmácia hospitalar. Na preparação, o medicamento é identificado com um rótulo branco, autocolante, onde o nome da substância é escrito à mão com uma caneta de ponta de feltro.

Nota: um dia eu zanguei-me exactamente por causa de uma caneta de feltro mas não vou desenvolver porque quero acreditar que os profissionais da saúde em Portugal não são um bando de imbecis sobretudo preocupados com as horas a que têm de partir para os privados onde também (ou principalmente...) exercem. E também quero acreditar que este caso foi uma excepção, como aquele em que se esqueceram de uma pequena tesoura cirúrgica dentro do paciente operado. Enfim... coisas que podem acontecer a qualquer um...