2009/11/26

Cheios de pruridos

Começa a ser um pouco fastidioso assistir-se ao espectáculo dos deputados resistirem à justificação das respectivas faltas. Todas as classes profissionais têm de o fazer, mas as senhoras e senhores deputados auto consideram-se acima da "média" e como tal acham que sua palavra bastará.

Eu permito-me discordar. E não discordo pelo facto de as senhoras e senhores deputados portugueses terem a imagem que têm devido ás suas atitudes e comportamentos. Não. Eu discordo simplesmente porque não considero, de todo, que as senhoras e senhores deputados estejam acima da "média", seja ela qual fôr, e também porque discordo totalmente do argumento, um pouco idiota nos dias que correm, de que "a palavra basta". Fátima Felgueiras e o ex-senhor do Marco de Canavezes, Ferreira Torres, nomeadamente, quando foram eleitos legitimamente pelo "povo", deixaram de ser quem são e passaram a gozar da plena confiança de que "a palavra basta"? E mesmo que isso acontecesse alguém iria acreditar na palavra deles, ainda que legítimos representantes do "povo"? Creio que não. Por isso as senhoras e senhores deputados deveriam tentar fazer um exerciciozinho de alguma, não muita, modéstia, que de resto não custa nada, e compreenderem que mesmo em parlamentos de países importantes, com peso na Europa e no mundo, a palavra não basta e os deputados têm de justificar as faltas. Ou será que as senhoras e senhores deputados portugueses se consideram acima da "média" não só dos portugueses mas também dos outros parlamentares?


E isto é espionagem quê?

Um funcionário do Ministério da Educação gravou ontem uma conversa informal entre jornalistas que ali esperavam por declarações do Secretário de Estado, sem que disso tivesse dado conta aos presentes. Interpelado sobre a razão de ser daquela gravação, respondeu apenas que usava “ as mesmas armas” dos jornalistas. O Ministério desvaloriza e afirma que a intenção era gravar uma declaração do secretário de Estado que acabou depois por não acontecer. publico.pt, 26.11.2009, 21:54


Geração rasca

Umas muy simpáticas funcionárias de um refeitório de uma universidade pública questionaram-me: o que pensa o "menino" de dois alunos andarem à pancada ao ponto de um ter tido de dar entrada nas urgências?

Devem ser impedidos de voltar a frequentar essa cantina e eventualmente banidos do ensino superior público, respondi, indagando sobre mais detalhes. Basicamente, um passou à frente do outro, na fila para o café, o segundo deu-lhe um "toque" e vai daí que o primeiro desfere uma violenta cabeçada que deixou o outro completamente KO e a jorrar sangue.

Sinais do tempo português... Os tipos que há dez, ou mais anos, mostraram o "rabinho" aos parlamentares (alguns consta terem exclamado: úuuíii, que vergónha!), para protestarem contra as propinas, e que foram alcunhados pela imprensa portuguesa como "geração rasca", comparados com estes sujeitos, violentos e agressivos, são uns simpáticos anjinhos.

Se isto continuar assim, ainda vai chegar de novo o tempo da polícia dentro das universidades. E já agora nas escolas de ensino básico, porque, em boa verdade, toda esta barbárie começa nas respectivas famílias e nas escolas de ensino básico que, por um lado, se sentem impotentes para travar a educação distorcida que as crianças recebem na generalidade dos lares portugueses, e por outro chafurdam em pseudo-teorias pedagógicas que têm destruído totalmente a educação em Portugal.


Num país sem educação

Isto: "O Estado português terá sido defraudado em mais de cinco milhões de euros desde 2004, altura em que um grupo de várias dezenas de empresários do ramo alimentar elaborou um esquema com várias empresas falidas ou quase inactivas de modo a iludir o fisco. Ontem, após 78 buscas realizadas em todo o país, acabaram por ser constituídos arguidos dez suspeitos, três dos quais foram detidos. As acusações são de burla qualificada, fraude fiscal qualificada, associação criminosa e branqueamento de capitais." (publico.pt, 26.11.2009, 15:03) é tão normal como eventualmente existirem governantes corruptos e como acontecerem mais ou menos sistemáticas interferências do governo nos media e na justiça.


A propósito da "espionagem política"

As acusações de “espionagem política” e de “emboscada judicial” no caso do processo conhecido como “Face Oculta” foram hoje repudiadas, em comunicado, pela Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP). Os dirigentes da ASJP consideram não ter havido “qualquer coincidência temporal entre os actos eleitorais de Setembro e as operações policiais de Outubro para se concluir pela completa falsidade daquelas acusações” de “espionagem política”.

Os seus subscritores consideraram ainda “inaceitável” que um vogal do Conselho Superior da Magistratura (CSM) que poderá a vir a intervir na classificação e disciplina dos juízes com intervenção no processo, “não tenha suspendido funções naquele órgão a partir do momento em que passou a ser mandatário de um dos arguidos”. Trata-se de Rui Patrício, advogado de José Penedos, ex-presidente da REN.

Os subscritores deste comunicado salientam o “infundado da imputação da violação do segredo de justiça aos elementos da investigação ou às autoridades judiciárias da comarca de Aveiro”. E notam que, “até à operação policial, realizada em 28 de Outubro e apesar de meses de trabalho, envolvendo muitas pessoas entre polícias, funcionários dos tribunais, procuradores e juízes nenhum facto era do conhecimento público”. Só com a realização das buscas, é que “certas informações” chegaram ao domínio público, refere o texto.

O comunicado lembra ainda que contrariamente ao que foi noticiado, “as escutas autorizadas pelo juiz de Instrução de Aveiro nunca tiveram por alvo o primeiro-ministro, mas sim os arguidos no inquérito”.

Os juízes lamentam também “todos os equívocos gerados pela falta de informação sobre a existência ou não de inquérito a propósito das certidões, a dilação temporal entre a recepção das certidões e a decisão de considerar não existirem elementos probatórios para iniciar uma investigação, bem como a inexplicada divergência de valoração dos indícios que foi feita na Comarca de Aveiro e pelo Procurador Geral da República”.

Em consideração com os deveres “de transparência e de informação, essenciais para a normal e saudável fiscalização social sobre a actuação das autoridades judiciárias” defendem o “esclarecimento daqueles equívocos, com a prestação da informação necessária” acerca das decisões do procurador geral da República e do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça. publico.pt, 26.11.2009, 17:11


A escandalosa hipocrisia do segredo de justiça

É notável a preocupação com o Estado de Direito, sobretudo quando os segredos começam a chegar aos jornais. Mas os segredos raramente chegam aos jornais antes de chegarem à classe dirigente. É aliás divertido ver programas de televisão em que gente muito séria e pomposa defende o Estado de Direito e o Segredo de Justiça ao mesmo tempo que demonstra saber pormenores sobre as escutas que os jornais não publicaram. Estão certamente a dizer-nos que o Segredo de Justiça não deve sair do círculo de pessoas bem relacionadas a que pertencem.

Soube-se hoje que o Segredo de Justiça no caso Face Oculta foi violado no fim de Junho, 4 meses antes de a violação ter chegado aos jornais. Essa violação do Segredo de Justiça favoreceu os suspeitos e a classe política associada. Só mesmo seguindo o conselho de Passos Coelho de não falar no assunto é que se pode preservar a credibilidade das instituições.

Note-se que algo semelhante já tinha acontecido no caso Casa Pia. Alguns dos suspeitos souberam que estavam a ser investigados através de circuitos de informação ligados às tais “instituições” dias antes de o assunto ter sido tornado público pelos jornais.